Congresso não é apontamento de erros, diz Cida de Jesus

Presidenta do PT-MG tem trajetória marcada pela luta sindical. Em entrevista à Agência PT, ela fala de assuntos como Lula e expectativas para Congresso

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6º Congresso Nacional do PT

Cida de Jesus

Cida de Jesus é presidenta do Diretório Estadual do PT de Minas Gerais. A trajetória até o cargo foi marcada pela luta social de base. Começou de forma simples, em meados da década de 1980, quando iniciou sua militância política no Vale do Jequitinhonha, região do norte de Minas historicamente marcada pela extrema pobreza.

Ela não tem dúvidas: ter vindo de onde veio foi fundamental para criar sua formação humanística que a transformou em uma personalidade respeitada internamente do partido. Ela sempre agiu de forma discreta e nunca se candidatou a um cargo público. “Minha vida foi sempre na militância”, explica.

Formada em Sociologia e Filosofia e pós-graduada em Ciências Políticas e em Fé e Política, Cida engajou-se no movimento estudantil e atuou na organização de sindicatos de trabalhadores rurais e em movimento sociais do Vale do Jequitinhonha. É filiada ao PT desde 1985.

“Para os jovens, o PT representava a esperança de uma vida mais digna aos brasileiros.

“Ter nascido no Jequitinhonha foi muito importante para minha formação. Lá comecei a militar nas pastorais, nas questões da juventude, em comunidades eclesiais de base e no movimento sindical rural. Eu tive a felicidade de participar de vários momentos de luta da redemocratização do País”, afirma.

Enquanto atuava pela melhoria de vida dos seus pares no norte de Minas, passou a ouvir falar de forma mais intensa de Luiz Inácio Lula da Silva, o sindicalista que havia poucos anos antes formado o Partido dos Trabalhadores em São Bernardo do Campo (SP). A novidade, define, passou a trazer esperanças dos jovens do País todo.

“Para os jovens, o PT representava a esperança de uma vida mais digna aos brasileiros. A juventude dos movimentos entrou em peso no PT. Naquela época, a gente de lugares como o Vale do Jequitinhonha pensava muito mais na defesa da vida do que em qualquer outra coisa”.

No PT, se sentiu mais forte para ajudar a realizar as transformações necessárias ao País.

Lula, lá

Uma música até hoje está na sua memória afetiva: Lula, lá / Brilha uma estrela / Lula, lá/ Cresce a esperança…, do jingle da campanha eleitoral de 1989. “Lula era a figura que poderia trazer a dignidade da vida aos brasileiros e às brasileiras”.

A vitória nas eleições presidenciais de 1989 não veio por pouco. Mas naquele momento se sacramentou a esperança de que o PT chegaria um dia ao poder. Certeza consagrada no 1º Congresso Nacional do PT, realizado em 1991 no Pavilhão Vera Cruz, em São Bernardo do Campo.

Hoje, às vésperas da realização do 6º Congresso Nacional do PT, tem orgulho das conquistas do partido nos últimos 37 anos. Mas afirma que é fundamental ir mais adiante.

“Não acho e nem defendo que o Congresso seja um apontamento de erros. Vejo o Congresso como um apontamento de soluções.

Ela destaca muitas vezes, durante a conversa com a Agência PT, que é imprescindível buscar unidade no 6º Congresso com um grande propósito: dar estrutura para Lula se tornar presidente do Brasil em 2018.

“Não acho e nem defendo que o Congresso seja um apontamento de erros. Vejo o Congresso como um apontamento de soluções. Soluções que devem perpassar pelo debate do retorno dos direitos que estão sendo sacrificados no País. Devemos repensar um sistema em que o conjunto do partido dê sustentação a Lula perante a sociedade brasileira nas eleições de 2018”.

A esperança, afirma ela, é a mesma que a fez entrar no Partido dos Trabalhadores 32 anos atrás.

“Dizem que quem tem esperança tem vida. E enquanto tem vida, tem esperança. Eu sou uma delas. Eu acredito na retomada das políticas públicas que estão sendo retiradas aos que mais precisam. E para retomar não tem outra pessoa, é o Lula. Ele representa a esperança e o resgate e avanços que precisamos protagonizar. Se o 6º Congresso apontar para essa direção, tiver essa unidade, terá valido a pena todo esse aperto que passamos nos últimos anos”.

“Os governos Lula e Dilma representam legados sagrados do partido e do Brasil. Mas precisamos ir além”.

Ganha e perde, perde e ganha

Ela afirma não ter se arrependido de nada durante todos esses anos de luta política. Só uma situação, confessa, a entristece: ter de buscar o mesmos direitos que a fez entrar na militância política no início da década de 1980.

“Me deixa triste a gente precisar estar em uma luta de resgate de direitos quando podíamos estar avançando muito mais. A gente tem que repensar conceitos e reinventar nossas ações, ou ficaremos nessa de ‘vamos, conquistamos, perdemos; vamos, conquistamos, perdemos…’. Há de se achar um caminho do meio desse pedregulho para garantir uma democracia forte”.

Para ela, é fundamental o conjunto do PT seguir em busca não só de conquistar, mas também de não perder direitos.

“Nós precisamos alcançar uma unidade em torno de um projeto que precisamos construir. Nós temos que avançar e demarcar os direitos do povo brasileiro. Uma discussão é fundamental: por que a democracia brasileira se torna tão frágil quando há uma crise institucional ou econômica?”, pergunta.

“Nós precisamos unir as experiências, trazer para esse debate os jovens e as mulheres e dar conta de repensar uma ação das esquerdas para a retomada de direitos. Não só retomada, mas também avanços que garantam que eles não sejam perdidos”, ratifica.

Mulheres na luta

Ao ser perguntada sobre as lembranças do 1º Congresso Nacional do PT, ela assume ficar saudosista: “É legal puxar a memória para os Congressos. É bom se sentir voltando na história”.

Para ela, o Congresso de São Bernardo do Campo a fascinou pela democracia interna do partido e pelos debates intensos e plurais. “Ali tive a certeza de que estávamos no caminho certo de ocupar um espaço de poder que pudesse transformar o País”.

Ela lembra que foi muito forte a figura do Lula recebendo e abraçando todo mundo. Ela parafraseia a frase que ficaria célebre pelo ex-presidente norte-americano Barack Obama: “Era a certeza de que Lula era o cara. Ele era a figura que o Brasil precisava mesmo”, diz.

Entre as resoluções do 1º Congresso, Cida destaca a implementação de cota de 30% de participação das mulheres na direção partidária do PT, uma conquista inédita na estrutura de todo e qualquer partido até então existente no Brasil.

Hoje, o PT reserva metade das vagas às mulheres. Ela exalta a medida e diz que as esquerdas precisam avançar ainda mais no tema.

“As mulheres têm sido protagonistas de lutas em todo o mundo. É um grito de liberdade. Todas as esquerdas tinham que ouvir esse grito com mais carinho e sabedoria. As mulheres seremos protagonistas das mudanças que precisam ser feitas”.

Erros e acertos dos Congressos

Do 2º Congresso Nacional do PT, ocorrido em Belo Horizonte em 1999, ela recorda do intenso debate sobre políticas públicas para dar estrutura à chegada de Lula ao poder, o que ocorreria três anos depois.

“Graças a esse Congresso que Lula, assim que foi eleito em 2002, conseguiu suportar a ‘panela de pressão’ que o Brasil vivia naquele momento. Trouxe uma calmaria saber que um sistema econômico funciona com o desenvolvimento de políticas públicas, o que foi debatido à exaustão em 1999”.

Se o 2º Congresso foi fundamental para o País, o de 2007, realizado em São Paulo (SP), acabou se perdendo em questões menos importantes, em sua avaliação. Naquela momento, relembra Cida, o partido já vivia sob forte perseguição da grande mídia e os debates foram mais pobres.

“Nós ficamos focalizados em questões muito pequenas, muito nos acessórios. Poderia ter aprofundado mais. Havia uma divisão interna. Acredito que há o momento de da demarcação e o momento em busca de unidade em torno de um projeto maior. Naquele momento a gente perdeu o timing”.

Dilma, um acerto

O 4º Congresso Nacional do PT, realizado em 2010 em Brasília, fechou questão em relação ao nome de Dilma Rousseff para ser candidata a presidenta após a era Lula. Para ela, uma decisão acertada da direção e da militância petista.

“Logo de começo ela colocou seu mote como ‘País rico é um país sem pobreza’. Já na primeira reunião com o Diretório Nacional ela trouxe duas questões fundamentais: o Minha Casa Minha Vida e o incentivo à agricultura familiar, causando uma efervescência na construção civil e na geração de emprego e renda no campo. Foi quando percebi que tínhamos acertado na escolha”.

“Tenho a convicção que o aconteceu com a Dilma [o golpe sacramentado em agosto de 2016] poderia ter acontecido com Lula ou com qualquer um”.

Em 2015 ocorreu o 5º Congresso, desta vez em Salvador (BA). As lembranças deste momento não são as melhores. “Não era o momento de debater. Estava todo mundo perdido, companheiros presos. Era uma conjuntura meio maluca, cada dia de um jeito diferente. Não havia um acúmulo de debate e conceitos. Aquele momento foi mais um encontro de militância”.

Aumento do conservadorismo

De acordo com a presidenta do Diretório do PT de Minas Gerais, os governos Lula e Dilma devem ser defendidos pelas transformações sociais realizadas no Brasil. Mas acredita que o PT falhou em não perceber o aumento da força conservadora no País.

“Nós desenvolvemos vários setores da sociedade, mudamos a qualidade de vida da população, e achamos que era suficiente. Não percebemos que havia uma direita conservadora que estava descontente com os avanços e que começava a se organizar. Não conseguimos achar instrumentos que desse respostas suficientes contra a organização conservadora”.

Para ela, havia diversas maneiras de barrar o crescimento do conservadorismo no Brasil. Uma das principais seria democratizar o acesso à informação pública.

“Passamos 13 anos no poder sem criar um instrumento eficiente de comunicação. O grande erro foi não ter buscado alternativa à mídia conservadora deste País”.

Por Bruno Hoffmann, da Agência PT de Notícias

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