É hora de debater a Reforma Política, afirma Gleide Andrade

Em entrevista, a dirigente do PT defende as reformas como meio de melhorar o sistema político-eleitoral para ampliar o combate à corrupção

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Gleide: “O Lula abraçou a causa e me chamou para rodar o País com ele, falando de Reforma Política”

A vice-presidente Nacional do PT e coordenadora da campanha pela Reforma Política proposta pelo partido, Gleide Andrade, afirma que o Brasil vive momento propício para discutir a reforma do sistema eleitoral. Para a petista, itens da proposta como o financiamento público de campanha serão um antídoto contra a corrupção eleitoral.

Para ela, os laços firmados entre candidatos e os empresários que os financiam tornam a política refém de interesses escusos e o processo pouco democrático. Gleide afirma que esta é a primeira de muitas reformas necessárias para o Brasil seguir avançando em todos os setores.

“Precisamos ter a capacidade pedagógica de explicar para o eleitor que fazer financiamento público de campanha, ao contrário do que a direita diz, é regular o uso desse dinheiro”, disse na semana passada, em Montes Claros (MG), pouco antes de se dirigir a mais uma das  plenárias que a petista realiza em todo País sobre o tema.

Confira a entrevista na íntegra, abaixo:

AGPT – O PT está encampando uma grande mobilização por um projeto próprio de reforma política. No que difere a proposta do PT?

Gleide Andrade- Estamos apresentando um projeto que eu considero o mais radicalizado dos discutidos hoje no Brasil. Nosso projeto de reforma política eleitoral é baseado em três pilares: financiamento público exclusivo de campanha, voto em lista preordenada e o aumento compulsório da participação das mulheres.

O PT propõe que seja formada uma Constituinte Exclusiva para discutir o sistema eleitoral brasileiro. Estamos convencidos que, somente com um projeto de iniciativa popular, vamos conseguir mudar nosso sistema eleitoral. Para isso, precisamos recolher 1,5 milhão de assinaturas.

Eu estive com o presidente Lula, ainda em junho, e ele me convocou para sensibilizar a base do PT e os movimentos sociais, porque ele também acredita na importância de um projeto de iniciativa popular. O Lula abraçou a causa e me chamou para rodar o País com ele, falando de Reforma Política.

 “O Lula abraçou a causa e me chamou para rodar o País com ele, falando de Reforma Política”

AGPT – E quais locais essa campanha já percorreu?

Estivemos na Bahia, em Mato Grosso do Sul, no Paraná e em Belém. Em Minas,  Uberlândia, Belo Horizonte, Vale do Mucuri, Vale do Jequitinhonha e agora no Norte do estado.

Este é o momento certo para tratar de reforma política? Às vésperas de uma eleição?

GA – Eu estou convicta de que se tem uma coisa que vai despertar a militância é a Reforma Política. Não só a militância, a sociedade. Ninguém suporta mais o sistema eleitoral que nós vivemos. Ninguém suporta esse sistema em que o poder do voto, a vontade popular, não é mais respeitada.

Mais do que nunca, nós precisamos discutir com a sociedade. Precisamos ter a capacidade pedagógica de explicar para o eleitor que fazer financiamento público de campanha, ao contrário do que a direita diz, é regular o uso desse dinheiro. É evitar que o político, depois de eleito, fique refém daquele que o financiou.

E qual a urgência?

GA – Existe uma proposta de um plebiscito popular feita pelos movimentos sociais. Essa é a única forma de mobilizar o Congresso para que ele possa convocar a Constituinte Exclusiva. O que somente ele pode fazer. E o congresso não vai convocar uma Constituinte que vá ferir o próprio interesse.

 “O congresso não vai convocar uma Constituinte que vá ferir o próprio interesse.”

A proposta do PT é que nós convoquemos imediatamente uma Constituinte Exclusiva. Nós não estamos nem passando pelo Plebiscito Institucional. Nós já queremos que o congresso que aí está possa convocar, para o ano que vem, uma Constituinte Exclusiva e determinar qual vai ser o regimento utilizado.

O PT é da opinião que o deputado escolhido para a função será impedido de ser candidato. Só assim ele vai atuar sem o vício do atual Congresso.

A Constituinte Exclusiva então instaurada, trataria única e exclusivamente destes pontos propostos pelo PT?

GA – Trataria apenas da reforma do sistema eleitoral. É muito importante ressaltar que essa Constituinte Exclusiva vai debater todo o Sistema Eleitoral vigente.

O que a direita tem feito é uma campanha para confundir a opinião do PT junto à sociedade, dizendo que uma constituinte pode mudar o sistema econômico, o sistema tributário. Isso não é verdade!

Nós queremos abolir o que há de mais retrógrado, que é o financiamento empresarial das campanhas. O que tem que valer é o CPF e não o CNPJ.

Como isso funciona?

GA – Vou te dar dois exemplos práticos. Na Alemanha, tão logo houve a queda do nazismo, o então governo preparou uma nova constituição e um novo sistema eleitoral. Em Portugal, assim que acabou o regime ditatorial de Salazar, eles fizeram sua Constituinte Exclusiva e aprovaram o seu sistema eleitoral.

O Brasil saiu do seu sistema ditatorial há 50 anos e ainda temos o mesmo sistema eleitoral. Vota-se do mesmo jeito.

Quer dizer, se você pegar a história do sistema eleitoral brasileiro, nas últimas décadas, apenas duas regras foram alteradas. Primeiro a reeleição, em 1997, por interesse do então presidente Fernando Henrique. E, há dois anos, quando o Brasil aprovou a Lei da Ficha Limpa.

Nós não podemos ter um sistema eleitoral que vai mudando por PEC [Proposta de Emenda à Constituição].

Diversas propostas de Reforma Política já foram enviadas ao Congresso nos últimos anos, inclusive pelo PT. Por que o Brasil está demorando tanto para fazer essa reforma?

GA – Porque o Congresso é extremamente conservador.

Estamos indo para 12 anos de legado de governos democráticos populares, que mudaram radicalmente a história do povo brasileiro. Tiraram 40 milhões de pessoas da linha da miséria. Vivemos hoje em um país de pleno emprego. E temos uma inflação extremamente controlada. Entretanto, se nós tivéssemos um Congresso que efetivamente representasse a vontade popular, o nosso País estaria ainda anos mais à frente.

A nossa presidenta é muito mais radicalizada nas propostas que tangem aos anseios da sociedade do que o parlamento. O nosso congresso não condiz com o executivo brasileiro.

A senhora confia no comprometimento do Congresso Nacional?

GA – Não há como confiar no atual Congresso. Existem reivindicações históricas da classe trabalhadora que sequer foram pautadas. Nós podemos falar da redução da carga tributária, da carga horária de trabalho, do fator previdenciário. E o congresso não vai pautar isso. Não vai pautar porque isso não é interesse dele. O poder Executivo não pode resolver isso sozinho.

Nós estamos convictos de que com o Congresso que nós temos atualmente, não vamos conseguir fazer Reforma Política. Em junho de 2013, quando a sociedade foi pra rua, sobretudo para questionar o sistema eleitoral brasileiro, a presidenta Dilma enviou ao Congresso um projeto de decreto que pedia um plebiscito oficial para ouvir o que as pessoas acham sobre o atual sistema eleitoral. Esse projeto sequer saiu da CCJ [Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania].

Como solucionar a “crise de representatividade” pelo qual o eleitor passa hoje?

GA – Acredito que se o Brasil não fizer uma Reforma Política, ele não vai conseguir fazer as outras reformas fundamentais que precisa. A Reforma Política é a mãe de todas as reformas.

A Reforma Tributária, que é tão urgente, é um exemplo. Ainda somos o país que tem uma das maiores cargas tributárias do mundo. E porque então ainda não fizemos a reforma tributária até hoje? Não é porque o governo não quer. É porque o congresso não quer. Porque ele não quer taxar as grandes fortunas. Isso tocaria diretamente naqueles que os financiam.

Hoje, de 513 deputados, somente 80 tem origem na classe trabalhadora, vieram do movimento sindical, do movimento social. A bancada ruralista é infinitamente maior que a bancada, por exemplo, dos deputados da agricultura familiar.

Solucionar esse déficit que existe da participação popular, passa necessariamente, por abrir novos canais de diálogo com a sociedade. De que forma isso pode ser feito, sem ferir a isonomia dos outros poderes, tornando esse processo realmente mais democrático?

GA – O que está mais atrasado é a forma de escolha do poder Legislativo do País. Por isso, as câmaras de vereadores, as assembleias estaduais são tão reféns dos seus financiadores. Por isso, nós do PT, dependemos tanto hoje da nossa base aliada para aprovar aquilo que é de interesse do governo.

Outra proposta do PT é aumentar a participação feminina. A política de cotas que existe hoje é suficiente? Como dar condições iguais, tanto para elas concorrerem quanto para elas se firmarem no cenário político?

GA – O PT é o partido mais centrado nessa questão no Brasil. Nós já temos a paridade dentro do PT. Hoje, 50% das nossas instituições são compostas por mulheres. O Brasil tem uma população feminina maior que a população masculina, com 53%. Por isso nós temos que fazer o aumento compulsório da participação das mulheres.

Temos que fazer isso através de políticas de paridade, como as que temos hoje dentro do PT. De políticas de promoção, de políticas afirmativas das mulheres, fortalecendo do interior para as capitais, com mais participação das mulheres nas câmaras de vereadores, nas assembleias estaduais. Isso é um trabalho compulsório. Nós vamos galgando devagar, até chegar no plano ideal.

Qual o plano ideal?

GA – Que nós possamos chegar a um Congresso em que nós tenhamos absoluta paridade, respeitando inclusive as cotas, de negros, índios, jovens. Isso já é algo que o PT inova.

É possível fazer uma Reforma Política realmente profunda sem promover mudanças na regulamentação e na democratização dos Meios de Comunicação?

GA – Estou convicta de que nós precisamos quebrar o monopólio dos meios de comunicação no Brasil.

Os principais adversários da presidenta Dilma são os meios de comunicação, porque eles também servem a uma oligarquia que a vida inteira comandou os principais veículos do País. Para fazer essa reforma, nós precisamos do Congresso. Logo, fica evidente mais uma vez a necessidade e a urgência da Reforma Política. O parlamento que aí está não vai votar.

Nós não suportamos mais viver em um País onde todo o controle do sistema de radiodifusão pertence a um grupo seleto, que controla os meios e vende a opinião que eles querem. Uma opinião vendida.

Nós precisamos permitir que, tal qual conseguimos aprovar o Marco Regulatório da Internet, nós precisamos ter o marco regulatório dos meios de comunicação. Abrir mais canais de televisão, mais rádios comunitárias, rádios educativas.

O financiamento público de campanha vai sanar essa relação promíscua que existe entre a iniciativa privada e aqueles que ela ajudou a eleger?

GA – É a única forma que existe. É o maior antídoto para acabar com a corrupção eleitoral. O único remédio para acabar com o poder do CNPJ é o financiamento público exclusivo.

Existe um certo temor, parte por desconhecimento, sobre a origem desse repasse. Qual deve ser a origem desse recurso? Ele vai prejudicar outros serviços prestados pelo governo? Em tese, vai sair da saúde e da educação, como alardeiam?

GA – A direita, para confundir, fala isso. Mas é justamente o contrário. Ela vai regulamentar um fundo, tal qual existe o fundo partidário. Um fundo que é destinado para a sobrevivência dos partidos. O orçamento vai ser definido pela Constituinte Exclusiva, bem como a origem.

Isso tornará as campanhas infinitamente mais baratas. Essa constituinte vai definir o percentual que será destinado para cada partido, de maneira proporcional, de maneira isonômica.

Outro ponto polêmico é o voto em lista preordenada. Por que priorizar o partido?

GA – Nós precisamos fortalecer os partidos, porque quem tem proposta é partido e não candidato. Nós precisamos parar com esse culto à pessoa. Hoje, quantos partidos pequenininhos existem no Brasil que ninguém sabe o que defende, o que segue? Essa pessoa se elege e não tem compromisso com absolutamente nada, a não ser com ela própria.

Nós estamos defendendo o voto em lista fechada. O partido define os candidatos e preordena dentro da lista. Assim, aquele parlamentar eleito, vai ter compromisso com os projetos que o seu partido defendeu. Ele terá que ter uma fidelidade partidária que hoje poucos partidos têm, como o PT e o PC do B. Isso é democratizar o sistema.

Por Flávia Umpierre, da Agência PT de Notícias

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