“Estamos regredindo à condição de colônia”, diz Fuser sobre política externa

Professor de Relações Internacionais da UFABC critica a política externa do governo Bolsonaro, responsável por uma desnacionalização da economia

José Eduardo Bernardes

Igor Fuser

O programa “No Jardim da Política” desta semana recebeu em estúdio o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC) e jornalista Igor Fuser. Ele falou sobre políticas internacionais do governo Bolsonaro e afirmou que o Brasil está vivendo o maior processo de desnacionalização da economia em toda história. “Estamos regredindo à condição de colônia. Estamos desistindo da industrialização, do desenvolvimento tecnológico e essa conta vai ser cobrada lá na frente”, alerta.

Para Fuser, o principal traço da política “bolsonarista” é o alinhamento absoluto e incondicional aos EUA. O Brasil entra nesse novo governo em posição subalterna ao governo Trump de um forma nunca vista antes, nem mesmo durante a Ditadura Militar. Fuser ainda cita o enfrentamento dos EUA com a China como uma questão central nessa política externa subalterna ao governo Trump. “A China é o principal parceiro comercial do Brasil e principal comprador das nossas commodities de exportação, como a soja e o ferro. Então qualquer limitação do comércio do Brasil com a China provocaria verdadeiro colapso em setores estratégicos da economia brasileira”, conclui.

As possíveis vendas de empresas estatais para o capital estrangeiro é outro ponto que Fuser destaca como perigoso para a economia e soberania do país. Ele denuncia o novo governo como “traidor da pátria e entreguista” e cita o pré-sal como um dos principais exemplos. Segundo ele, durante os governos de Lula e Dilma, o maior tesouro na indústria do petróleo mundial das últimas décadas foi explorado de acordo com uma política de desenvolvimento e investimento interno que foi abandonada no governo Temer. ”Acabar com a Previdência para beneficiar bancos, a educação… privatizar universidades, para entregar esse mercado para o capital externo. Desmantelar o Sistema Único de Saúde (SUS), para aprofundar o setor da medicina privada mercantil que visa o lucro. Então é uma ofensiva em todas as frentes”.

No entanto, este retrocesso não vai na contramão dos processos mundiais, ao contrário. O jornalista comenta que é preciso entender que esse avanço da direita acontece em vários países e é um resultado do próprio fracasso do capitalismo em atender as demandas das massas. Para Fuser, “existe um descontentamento muito grande. O capitalismo gerou expectativas de melhoria de vida, principalmente pelo avanço tecnológico, mas isso não aconteceu, então as pessoas estão com muita raiva e politicamente essa raiva é canalizada para um lugar e a direita tem conseguido se aproveitar disso. Ela aponta inimigos. É o imigrante na Europa, a esquerda na América Latina, o fundamentalismo religioso em outros países.”

O avanço de governos progressistas nas últimas décadas na América Latina, Caribe e no Brasil, como os governos do PT, foi responsável por grandes avanços nos campos sociais, mas também favoreceu um contra-ataque dessas forças opositoras. Neste sentido, Fuser ressalta a importância da resistência de países como Cuba e atualmente a Venezuela, que passa por uma grande crise política e econômica. Ele ainda critica a cobertura da mídia tradicional, que não mostra o contexto de boicote internacional e sabotagem pelo qual nosso vizinho passa. Aproveitando o gancho da posse de Nicolás Maduro na Venezuela, que acontece nesta quinta-feira (10), o jornalista rebate críticas sobre a legitimidade das eleições venezuelanas.

“Na Venezuela, trata-se de um governo legítimo, Maduro foi eleito em eleições competitivas. Falam-se em fraude, mas que fraude? Que denúncia foi essa? Ele é mais legítimo que o Bolsonaro, que só foi eleito porque inviabilizaram a candidatura do Lula. Assim como a disseminação massiva de notícias falsas é outra sombra que enfraquece a legitimidade do governo brasileiro. Agora, para a mídia brasileira o que não é legítimo é o da Venezuela, onde não aconteceram essas coisas”, reforça.

O professor explica que a situação da Venezuela é parecida com a de Cuba no início da Revolução. O país atualmente tem sofrido sanções de outros países, que são as principais responsáveis pela crise de abastecimento de itens básicos que assola o país. Para Fuser, “Maduro foi na contramão das normas injustas do cenário internacional, então enquanto no mundo inteiro estão se eliminando direitos trabalhistas e proteção social, na Venezuela isso aumentou”.

Ele ainda explica que a aproximação da Venezuela com China e Rússia deve ser vista com naturalidade perante o contexto de invasão iminente que o país sofre. Os EUA já deram inúmeros indícios e declarações de uma invasão ao território venezuelano. Fuser relembrou que “a História mostra que quando os EUA ameaçam, a chance de concretização é grande”. “O governo da Venezuela está tentando de todas as forças resistir a essa pressão de fora e nisso eles não são bobos, vão buscar aliados no cenário internacional”, pondera.

A entrevista chega ao final com uma importante autocrítica e um apelo para que os novos rumos políticos sejam enfrentados com uma maior integração. “Temos que aprender com as derrotas. Nós que somos de esquerda precisamos aprender a sair da nossa bolha e conversar com as pessoas, voltar ao trabalho de base, ao diálogo e à comunicação. Essa vitória da direita não aconteceu porque de repente todo mundo virou fascista. Mas por falta de diálogo muitos acabaram sendo arrastados e enganados, essas pessoas tem que ser esclarecidas”, encerra Fuser.

Além da entrevista no estúdio com Igor Fuser, o programa também contou com entrevista com a poeta, atriz e diretora teatral Luiza Romão, premiada nas competições Slam do 13 e Slam da Guilhermina. Ela falou sobre a importância do slam no Brasil, o protagonismo das mulheres na literatura e a importância das manifestações culturais, principalmente no atual momento político do Brasil.

Por Brasil de Fato

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