Impeachment sem crime de responsabilidade agride a democracia, alertam juristas

Os juristas André Ramos Tavares e Gilberto Bercovici sustentam que crises políticas, crises econômicas e até crises sociais não constituem elementos suficientes para a abertura de um processo de impeachment

Gil Ferreira/SCO/STF

Justiça - STF

Dois influentes juristas brasileiros, André Ramos Tavares e Gilberto Bercovici, alertam para o risco à democracia com a admissão de um processo de impeachment sem que haja crime de responsabilidade. A comprovação de prática ilícita por parte do presidente da República é condição imposta pela Constituição para a perda do mandato.

“A utilização de um mecanismo, como o impeachment, pelo Congresso Nacional significa, sempre, inabilitar milhões de votos e conexões construídas no tecido social pelos partidos políticos e pelo cidadão”, sustenta Tavares, referência acadêmica para o Direito Constitucional no Brasil e no exterior. Foi pró-Reitor de Pós-Graduação stricto sensu da PUC-SP e diretor da Escola Judiciária Eleitoral Nacional, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

As considerações constam em dois pareceres, divulgados nesta terça-feira (20), elaborados à pedido do coordenador jurídico da campanha à reeleição da presidenta Dilma Rousseff, o advogado Flávio Caetano. As avaliações serão somadas às análises dos juristas Dalmo de Abreu Dallari, Celso Antonio Bandeira de Mello e Fábio Konder Comparato.

O jurista afirma também o processo de impeachment é previsto apenas para casos excepcionais que envolvam “atentado à Constituição”.

“Ignorar essa circunstância é, uma vez mais, estabelecer o regime da instabilidade democrática, cujos resultados só podem ser, a curto, médio e longo prazos, catastróficos para a sociedade”, adverte para o uso inadequado do mecanismo.

Nesse sentido, adverte o professor, “crises políticas, crises econômicas e até crises sociais não constituem, por si mesmas, elementos ensejadores de um processo de impeachment”.

“Descontentamento político com a postura de algum Presidente da República, desilusão com determinadas políticas econômicas (ou com políticas públicas) e, igualmente, o esmorecimento de laços de confiabilidade no projeto governamental, como sentenciar, por convicção pessoal, que “a Presidente não tem mais condições de governar o país”, não ensejam impeachment”, escreve o jurista.

Para o advogado e professor titular de Direito Econômico e Economia Política da USP e do Mackenzie, Gilberto Bercovici, a função do impeachment não é “punir indivíduos”, mas proteger o país de danos ou ameaças por parte um governante que abusa do seu poder ou subverte a Constituição”.

Bercovici atenta ainda para o fato de o impeachment ser um “último recurso”. “Um poder a ser exercido com extrema cautela em casos extremos de comprovada violação da Constituição”, afirma.

O professor esclarece que para configurar crime de responsabilidade não bastam atos que “comportam omissão ou a culpa”, mas é preciso “a atuação deliberada (e dolosa) do Chefe do Poder Executivo”.

“O Presidente da República não pode ser réu de um processo de impeachment motivado por atos estranhos à função presidencial ou ocorridos fora do seu mandato”, escreve Bercovici.

Os juristas confirmam o posicionamento de Dallari ao destacar a necessidade de que o crime de responsabilidade seja praticado no exercício do atual mandato presidencial. Eles reforçam também que a reprovação das contas do governo pelo Tribunal de Constas da União (TCU) não pode ser utilizada como fundamento de eventual denúncia por crime de responsabilidade.

Da Redação da Agência PT de Notícias

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