Intelectuais lançam manifesto em defesa da democracia e do governo Dilma

Grupo se reuniu na manhã desta sexta-feira (16), na USP, para discutir o risco que uma ruptura democrática representaria para a estabilidade do País

Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Um grupo de intelectuais com nomes como a filósofa Mariela Chauí e o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, divulgou um manifesto a favor do governo da presidenta Dilma Rousseff, nesta sexta-feira (16). Eles se reuniram no Centro Maria Antonia, na Universidade de São Paulo (USP), na manhã desta sexta, para discutir o assunto. O local é um símbolo de resistência à ditadura militar.

Para eles, a possível retirada de Dilma da Presidência representaria uma violação do princípio do Estado de Direito e da democracia representativa. “Impeachment foi feito para punir governantes que efetivamente cometeram crimes. A presidente Dilma não cometeu qualquer crime. Impeachment é instrumento grave para proteger a democracia, não pode ser usado para ameaça-la”, defendem.

“Os parlamentares brasileiros devem abandonar essa pretensão de remover a presidente sem que exista nenhuma prova direta e frontal de crime. O que vemos hoje é uma busca sôfrega de um fato ou interpretação jurídica para justificar o impeachment”, avalia a carta.

“Busca-se agora interpretações bizarras nunca antes feitas neste país”, acrescenta. Na avaliação dos intelectuais, a “proposta de impeachment implica sérios riscos à constitucionalidade democrática consolidada nos últimos 30 anos no Brasil”.

No documento, o coletivo declara que os atrasos de repasses para bancos, que ficaram conhecidos como “pedaladas fiscais”, não são crime de responsabilidade. De acordo com eles, há atualmente “uma busca sôfrega” por parte dos opositores, para encontrar uma justificativa para a destituição da presidenta.

Os intelectuais e acadêmicos ressaltam ainda que a democracia tem funcionado de maneira plena sem qualquer ingerência do Executivo e que a “aventura do impeachment” põe em jogo essa conquista.

Leia a carta na íntegra:

A sociedade brasileira precisa reinventar a esperança

A proposta de impeachment implica sérios riscos à constitucionalidade democrática consolidada nos últimos 30 anos no Brasil. Representaria uma violação do princípio do Estado de Direito e da democracia representativa, declarado logo no art.1o. da Constituição Federal.

Na verdade, procura-se um pretexto para interromper o mandato da Presidente da República, sem qualquer base jurídica para tanto. O instrumento do impeachment não pode ser usado para se estabelecer um “pseudoparlamentarismo”. Goste-se ou não, o regime vigente, aprovado pela maioria do povo brasileiro, é o presidencialista. São as regras do presidencialismo que precisam vigorar por completo.

Impeachment foi feito para punir governantes que efetivamente cometeram crimes. A presidente Dilma Rousseff não cometeu qualquer crime. Impeachment é instrumento grave para proteger a democracia, não pode ser usado para ameaçá-la.

A democracia tem funcionado de maneira plena: prevalece a total liberdade de expressão e de reunião, sem nenhuma censura, todas as instituições de controle do governo e do Estado atuam sem qualquer ingerência do Executivo.

É isso que está em jogo na aventura do impeachment. Caso vitoriosa, abriria um período de vale tudo, em que já não estaria assegurado o fundamento do jogo democrático: respeito às regras de alternância no poder por meio de eleições livres e diretas.

Seria extraordinário retrocesso dentro do processo de consolidação da democracia representativa, que é certamente a principal conquista política que a sociedade brasileira construiu nos últimos trinta anos.

Os parlamentares brasileiros devem abandonar essa pretensão de remover presidente eleita sem que exista nenhuma prova direta, frontal de crime. O que vemos hoje é uma busca sôfrega de um fato ou de uma interpretação jurídica para justificar o impeachment. Esta busca incessante significa que não há nada claro. Como não se encontram fatos, busca-se agora interpretações jurídicas bizarras, nunca antes feitas neste país. Ora, não se faz impeachment com interpretações jurídicas inusitadas.

Nas últimas décadas, o Brasil atingiu um alto grau de visibilidade e respeito de outras nações assegurado por todas as administrações civis desde 1985. Graças a políticas de Estado realizadas com soberania e capacidade diplomática, na resolução pacifica dos conflitos, com participação intensa na comunidade internacional, na integração latino-americana, e na solidariedade efetiva com as populações que sofrem com guerras ou fome.

O processo de impeachment sem embasamento legal rigoroso de um governo eleito democraticamente causaria um dano irreparável à nossa reputação internacional e contribuiria para reforçar as forças mais conservadoras do campo internacional.

Não se trata de barrar um processo de impeachment, mas de aprofundar a consolidação democrática. Essa somente virá com a radicalização da democracia, a diminuição da violência, a derrota do racismo e dos preconceitos, na construção de uma sociedade onde todos tenham direito de se beneficiar com as riquezas produzidas no pais. A sociedade brasileira precisa reinventar a esperança.

Assinam, entre outros: Antonio Candido; Alfredo Bosi; Evaristo de Moraes Filho e Marco Luchesi, membros da Academia Brasileira de Letras; Andre Singer; o físico Rogério Cézar de Cerqueira Leite; Ecléa Bosi; Maria Herminia Tavares de Almeida; Silvia Caiuby; Emilia Viotti da Costa; Fabio Konder Comparato; Guilherme de Almeida, presidente Associação Nacional de Pós-Graduação em Direitos Humanos, ANDHEP; Maria Arminda do Nascimento Arruda; Gabriel Cohn; Amelia Cohn; Dalmo Dallari; Sueli Dallari; Fernando Morais; Marcio Pochman; Emir Sader; Walnice Galvão; José Luiz del Roio, membro do Fórum XXI e ex-senador da Itália; Luiz Felipe de Alencastro; Margarida Genevois e Marco Antônio Rodrigues Barbosa, ex-presidentes da Comissão Justiça e Paz de São Paulo; os cientistas políticos Cláudio Couto e Fernando Abrucio; Regina Morel; o biofísico Carlos Morel; Luiz Curi; Isabel Lustosa; José Sérgio Leite Lopes; Maria Victoria Benevides, da Faculdade de Educação da USP; Pedro Dallari; Marilena Chaui; Roberto Amaral e Paulo Sérgio Pinheiro.

Por Cristina Sena, com informações dos Jornalistas Livres

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