Senadora lança projeto para tirar detidas com bebês da cadeia

Prisões abrigando mulheres com recém-nascidos não combatem violência. Projeto de senadora do PT troca prisão preventiva nesses casos por domiciliar

Condepe/Divulgação

Jéssica Monteiro, 24, com o filho recém-nascido, na carceragem do 8ºDP em SP

O Brasil e o mundo ficaram sabendo nesta semana que um bebê recém-nascido passou dois dias em uma cela de delegacia junto com a mãe, que havia sido presa com o marido em São Paulo. Ela estava lá cumprindo prisão preventiva (antes de ter sido julgada e condenada) porque a polícia achou com ela e com o companheiro cerca de 86 gramas de maconha. O marido estava em outra cadeia. O outro filho de três anos que eles têm ficou com alguém da família, a Justiça não o levou em consideração ao prendê-la, muito menos o bebê recém-nascido, que passou seus primeiros dias atrás das grades.

Para que casos como esse não venham mais a ocorrer, a senadora Regina Sousa (PT-PI) criou um projeto de lei que substitui a prisão preventiva de mulheres grávidas ou lactantes por prisão domiciliar, no caso de crimes de menor potencial ofensivo.

É que o episódio tétrico da mãe com um recém nascido encarcerado em São Paulo não é fato isolado. De dois meses para cá, dados juntados em relatórios do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Conselho Nacional de Justiça e da Secretaria de Administração Penitenciária mostram que o total de mulheres no sistema prisional aumentou 698% em 16 anos.

Em 2000, eram 5.601 detentas em todo o País, número que subiu para 44.721 em 2016. A grande maioria, assim como a mãe paulista, é pobre, não cursou o ensino médio e responde por tráfico de drogas. Cerca de 40% da população carcerária brasileira está submetida a prisão preventiva, ou seja, está presa sem ter sido condenada, em presídios superlotados.

De 2006 a 2014, a população carcerária cresceu 55%Já a taxa de crescimento das prisões por tráfico foi de 345%, sendo que 66,4% dos presos por drogas não possuem antecedentes criminais e foram presos em flagrante, sem investigação e condenados somente por tráfico, sem outros delitos. 

A distinção entre usuário e traficante posta em lei em 2006 veio para descriminalizar o porte de droga para consumo próprio. Outra norma do mesmo ano elevou o tráfico de drogas a crime hediondo.

O que deveria servir para reduzir a repressão ao consumo e focar a atenção das autoridades no combate ao negócio da droga, acabou por ter efeito inverso, graças à atuação das forças policiais e de setores do Poder Judiciário, que levaram a criminalização seletiva de setores mais vulneráveis da sociedade. Os usuários pobres, de comunidades, foram promovidos a traficantes, enquanto os traficantes de áreas nobres foram rebaixados a usuários.

Neste cenário, um perfil em específico é mais penalizado que os demais: o de mulheres grávidas e lactantes. O levantamento do Depen aponta que 80% das mulheres presas são mães e responsáveis principais ou únicas pelos filhos. Por esse motivo, o departamento considera que os “efeitos do encarceramento feminino geram outras graves consequências sociais”.

Em um estudo divulgado em junho do ano passado, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) analisou a situação da população feminina encarcerada que vive com filhos em unidades prisionais femininas no país, tendo entrevistado ao menos 241 mães. Foi diagnosticado que 36% delas não tiveram acesso adequado à assistência pré-natal; 15% afirmaram ter sofrido algum tipo de violência; 32% das grávidas presas não fizeram teste de sífilis e 4,6% das crianças nasceram com a forma congênita da doença. Além disso, apenas 5% das prisões femininas possuem creches.

O projeto

É com este quadro em mente que a senadora Regina Sousa (PT-PI) apresentou o Projeto de Lei do Senado 43/2018, “que altera a Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016 (Marco Legal da Primeira Infância) para dispor sobre os direitos das crianças cujas mães e pais estejam submetidos a medida privativa de liberdade.”

O projeto da parlamentar, que está em tramitação da Comissão de Constituição e Justiça, determina que mulheres lactantes em prisão preventiva que não tenham sido presas em flagrante por crime contra a vida tenham a prisão convertida em domiciliar.

“Há tanta gente que obtém o benefício da prisão domiciliar que representa bem maior risco à sociedade do que essas mães, que nem julgadas foram. A verdade é que ficam presas nessas condições só mulheres pobres, a maior parte das vezes presas por tráfico e em celas superlotadas, e quem mais perde em termos de direitos é o bebê, que não é culpado de nada”, resume a senadora.

Em sua justificação de motivos da lei, Regina Sousa explica: “Considerando o enorme déficit de vagas em nosso sistema carcerário, que supera os 50%, o incremento no número de detenções não somente deixou de contribuir para reduzir os índices de violência como, certamente, vem atuando para sua elevação. Isso porque nossos lamentáveis presídios superlotados acabam por deixar pessoas envolvidas em crimes de menor potencial ofensivo sujeitos a recrutamento pelas hordas do crime organizado.”

Por fim, a parlamentar exibe os números da realidade que quer combater: “Destaca-se no crescimento da população carcerária a elevação no número de mulheres aprisionadas, que subiu de menos de 6 mil no ano 2000 para quase 45 mil em 2016, um aumento de aproximadamente 700% no período. Grande parte delas, mais de 60%, reclusas por crimes associados ao tráfico, sendo que 43% não foram sequer sentenciadas. Com esses números, o Brasil é a quinta maior população carcerária feminina do mundo, atrás dos Estados Unidos, China, Rússia e Tailândia.”

Vinícius Segalla, da Agência PT de Notícias

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