Tarso Genro: Lula sofre um cerco por se preocupar com os pobres

Ex-governador do Rio Grande do Sul afirma que Lava-Jato foi desvirtuada para fins políticos e que resultou em um governo mais corrupto do que o de Berlusconi

Pedro Revillion/Palácio Piratini

Tarso Genro

Para Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande do Sul e eleito por duas vezes prefeito de Porto Alegre, a Lava-Jato foi uma operação de combate à corrupção que acabou por desvirtuar-se e tornar-se um instrumento para destruir a esquerda brasileira.

Genro é advogado e já foi ministro da Educação e da Justiça durante os governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, o suposto combate à corrupção da Lava-Jato colaborou para o golpe, que colocou uma “confederação de denunciados e investigados” no governo do país.

“A operação “Mãos Limpas” brasileiras resultou em um governo pior que o do Berlusconi na Itália”, afirmou ele, em referência à operação italiana na qual a Lava-Jato foi inspirada.

Na avaliação do petista, a esquerda deve se unir em torno de um novo programa, que inclui uma reforma tributária profunda – desonerando os mais pobres e onerando os mais ricos – com taxação de grandes fortunas, fim da isenção de impostos para lucros e dividendos entre outras medidas.

Sobre Lula, Genro acredita que o ex-presidente está sendo perseguido assim como muitos outros líderes políticos brasileiros que olharam para os mais pobres – como Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck e Jango Goulart. “O Lula está sofrendo um cerco como todos os grandes presidentes que o Brasil teve que tiveram alguma preocupação com os pobres”, diz ele.

Leia abaixo a íntegra da entrevista:

O que é, na sua avaliação, a Operação Lava-Jato?

A Operação Lava-Jato é um movimento de dentro do Estado contra a corrupção. Nesse movimento que ela faz para atacar a corrupção existem desvirtuamentos de natureza política que transformam a Lava-Jato em um processo híbrido, de uma parte uma operação normal do Estado para acabar com a corrupção e de outra parte um instrumento político, de ataque de demolição dirigido contra o PT e contra a esquerda. Não usam os mesmos critérios para apurar esses que estão no governo que é uma confederação de investigados e denunciados sem consequência.

Se for corrigido algumas injustiças e determinadas inconstitucionalidades e ela se aprofundar e for para todo o espectro político pode ser positivo. Senão ficará apenas como o ritual de demolição política de um projeto representado pelo PT e pela esquerda que tem contas a pagar mas muito menos do que as forças conservadoras no país.

 

Ela contribuiu para o cenário de instabilidade do país? Como?

A instabilidade do país tem a ver substancialmente com a Lava-Jato. A partir de um certo momento a Lava-Jato tornou-se um instrumento para derrubar a presidenta. Ela alienou-se de seus fins legais e transformou-se em um instrumento político. E formou-se uma ampla frente da mídia oligopolizada, de centros de inteligência do capital financeiro e setores conservadores para instituir um novo governo.

E a instituição desse novo governo não se coaduna com os fins formais da Lava-Jato que é o combate à corrupção. A instabilidade que está aí deve sim a Lava-Jato principalmente pelos desvirtuamentos. Não pelos processos justos e legais que são a investigação da corrupção.

A instabilidade do país tem a ver substancialmente com a Lava-Jato. A partir de um certo momento a Lava-Jato tornou-se um instrumento para derrubar a presidenta.

 

Quais são alguns desses abusos do poder judiciário?

A partir do momento que o Supremo começou a aceitar prisões por tempo indeterminado sem transito em julgado. A aceitar delações de réus presos sendo forçados e orientados a dar determinadas declarações nitidamente isso alterou o jogo político e isso favoreceu a instabilidade do governo Dilma e a substituição por essa confederação de denunciados e investigados.

 

O que ocorreu para que Dilma fosse retirada ilegalmente do poder?

Aquilo que era uma aliança para promover reformas e mudanças sociais virou uma aliança golpista. Essa mudança do PMDB dentro da coalizão foi o que resultou no xeque mate do governo Dilma. E acabou acontecendo o que a gente previa há dois anos. Que a operação “Mãos Limpas” brasileira resultou em um governo pior que o do Berlusconi.

A operação “Mãos Limpas” brasileiras resultou em um governo pior que o do Berlusconi.

 

Qual o próximo passo?

Nós temos que ter a humildade de entender que o PT só muda se sofrer um impacto de fora para dentro.  Significa compor com demais forças da academia, dos movimentos sociais e demais partidos uma nova fração política. Do qual o PT não deve pretender ser hegemônico.

Deve ser um dos principais centros dessa nova frente compartilhado com os setores novos que surgiram na resistência ao golpe que estão nas ruas resistindo e deslegitimando o governo temer e que pretendem uma revisão programática para um governo da esquerda democrática no país.

 

Qual é essa revisão programática?

Os nossos momentos mais intensamente virtuosos se deram em um momento que o estado brasileiro era financiado pelo preço das commodities no mercado internacional que permitiu que, ao mesmo tempo que sofríamos a extorsão do capital financeiro globalizado nós pudéssemos desenvolver políticas sociais altamente positivas para os mais pobres do pais.

Quando falo em renovação programática é que nós temos que gerar um processo de acumulação privada e pública baseado nas nossas próprias forças e não aumentando a dívida pública. O que deve ser feito é implementar impostos sobre as grandes fortunas, imposto de rendas sobre capitais, aumentar a tabela de imposto de renda para cobrar mais dos mais ricos e desonerar a classe média.

Aumentar o imposto sobre grandes heranças. Fazer uma reforma tributária para que os Estados não entrem em guerra fiscal. Criar mecanismos mais fortes de combate à sonegação, criminalizando de maneira mais forte a sonegação. Para criar uma poupança externa no próprio país e não depender do capital financeiro que extorque as riquezas do país porque controlam as políticas de juros no mercado global.

 

E Porto Alegre? Qual o momento que a cidade atravessa e porque é importante a eleição de Raul Pont?

A cidade sofre os impactos da crise toda. Ela não foi reestruturada politicamente para enfrentar esse período da globalização, nem reestruturada financeiramente para enfrentar a crise financeira global nacional e regional. Nós temos que ter um governo que retome a cumplicidade com a população organizada. Que discuta os grandes projetos, que discuta os recursos, como nós fazíamos no Orçamento Participativo. Para reciclar a cidade financeiramente e politicamente. Ela não ficou parada esse tempo todo. Ela sofreu modificações, algumas positivas e outras negativas.

Mas para o conjunto da população das classes de renda média e baixa o conjunto das modificações foi negativo. Hoje temos mais crianças pobres na rua, mais pessoas desabrigadas e sem habitação. E os cortes que o governo Temer está fazendo e o governo Sartori está fazendo estão atingindo de maneira cada vez mais forte à baixa renda. É isso que o Raul tem condições de responder. Pela experiência que ele tem, pela capacidade de gestão que ele já demonstrou e pela fidelidade aos princípios da participação popular que vem lá do governo do Olivio Dutra.

E os cortes que o governo Temer está fazendo e o governo Sartori está fazendo estão atingindo de maneira cada vez mais forte à baixa renda. É isso que o Raul tem condições de responder.

Candidato Raul Pont. Foto: Caroline Bicocchi

Candidato Raul Pont. Foto: Caroline Bicocchi

Como o senhor vê a perseguição ao ex-presidente Lula?

O Lula está sofrendo um cerco como todos os grandes presidentes que o Brasil teve que tiveram alguma preocupação com os pobres. Não é algo novo. Foi feito contra o Juscelino, contra o Jango contra o Getulio. Esses processos de investigação contra o Lula – todo mundo tem que ser investigado se tiver alguma suspeita – mas isso que está sendo feito com ele com a ajuda da grande mídia é a destruição da sua figura. E isso é notório porque todo esse processo desembocou não na luta contra corrupção. Mas num governo essencialmente muito mais investigado e denunciado.

Por Clara Roman, da Agência PT de Notícias

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