Universidade tem que vibrar contra o golpe, diz ex-reitor da UnB

José Geraldo de Souza Jr. é um dos 100 autores que escreveram para o livro “A Resistência ao Golpe de 2016”, cujo lançamento teve a presença de Dilma Rousseff

Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Um dos autores do livro “A Resistência ao Golpe de 2016” e ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), o professor da Faculdade de Direito José Geraldo de Souza Jr. considera decisivo o papel das universidades no atual momento político nacional. Durante o lançamento do livro no auditório Darcy Ribeiro, na UnB, que teve a presença da presidenta eleita, Dilma Rousseff, o professor ressaltou que o espaço da universidade é de “diálogo plural” e que só pelo via do voto seria possível afastar Dilma do cargo.

“Num momento como esse de crise, em que aventuras de assalto ao aparato institucional se realizam, a universidade tem que vibrar, tem que ser mobilizadora e abrir essa discussão do golpe”, avaliou José Geraldo de Souza Jr.

“Agora está claro que Dilma foi alvo de uma conspiração, de uma aventura sem compromisso com o social. Nosso papel é construir essa narrativa que, aqui com o lançamento desse livro, foi um dos objetivos. Ela só pode ser retirada do lugar em que foi colocada por voto livre, legítimo e soberano por outro voto livre, legítimo e soberano. Se o povo errou, a democracia conta com essa possibilidade, mas diz que ele corrije votando mais uma vez.”

Foto: EBC

José Geraldo de Souza Jr., ex-reitor da UnB. Foto: EBC

A obra reúne artigos de mais de 100 autores ligados ao Direito e conta também com textos de jornalistas e políticos, não apenas do Brasil, mas também de países estrangeiros. O livro foi organizado pela coordenadora do Programa de Doutorado em Direito da PUC-Rio, Gisele Cittadino, pela professora de Direito Internacional da UFRJ Carol Proner, pelo advogado Marcio Tenebaun e pelo advogado trabalhista Wilson Ramos Filho. De acordo com os organizadores, após o lançamento inaugural na UnB, o livro será lançado também em todos os Estados brasileiros.

“Consideramos o livro a ocupação de um espaço de fala pública de pessoas que, dos seus diversos campos de conhecimento, vêm acrescentar um argumento à nossa tese de que o processo em curso é sem substância, embora seja um processo formalmente legal”, afirmou Beatriz Vargas, professora Faculdade de Direita da UnB.

“A isso denominamos golpe parlamentar e entendemos que muitos dos artigos são verdadeiros pareceres jurídicos que podem ser utilizados em defesa da presidenta, Dilma Rousseff.”

Professor de Direito da UnB e ligado à Universidade de Yale (EUA), o jurista Marcelo Neves conta que o livro foi concebido por “profissionais de todo o país que estão indignados”. “Esse processo de impeachment na verdade não está fundamentado na Constituição, é uma deturpação do sistema constitucional brasileiro e implica realmente em um golpe no sentido ideológico, a escamoteação da verdade utilizando o instituto do impeachment para deturpar a Constituição”, afirma. “Todos os que estão firmes na resistência se envolveram neste livro. Vamos continuar lutando contra o golpe com grupos suprapartidários. É um fora Temer porque ele é ilegítimo e não tem base constitucional.”

Amparado em diversos textos com argumentos jurídicos explicitando o golpe articulado por Michel Temer, o livro possui também uma dimensão política fundamental: denunciar o golpe. Essa é a avaliação de Gladstone Leonel Jr., doutor em Direito Constitucional pela UnB, e presente ao lançamento.

“A ideia de lançar este livro é justamente denunciar um golpe político e jurídico que fica muito claro na conjuntura atual”, diz. “Os impactos são tremendos para as instituições brasileiras, uma vez que a democracia começa a se consolidar agora. É muito imporante a gente denunciar isso, tanto no Brasil, como fora do país, trazendo um pouco essa dimensão jurídica e denunciando de uma forma intransigente para todos os cantos do país, da América Latina e do mundo.”

Simbolismo
O caráter simbólico do livro foi ressaltado pela presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral, especialmente porque foi a primeira visita de Dilma a uma universidade depois de ser afastada pelo Senado. “[O livro] é contar a história do presente”, diz.

“A luta não acabou, a luta continua, nós não desistimos. Mostra que a universidade está extremamente organizada em resistência ao golpe. A UnB foi a primeira, mas, como presidenta eleita, agora ela vai a outras universidades, como combatente a esse golpe.”

O lançamento foi marcado também por outro ato simbólico, a leitura de um manifesto do movimento Mulheres da UnB contra o golpe e pela democracia. Composto por professoras, estudantes e profissionais da universidade, o movimento promoveu o manifesto por avaliar que “as instituições democráticas estão ameaçadas” com o golpe.

“Somos a favor da manutenção das conquistas sociais, dos direitos humanos, do Estado Democrático e de Direito contra toda forma de corrupção e autoritarismo em nossa sociedade”, diz trecho do manifesto.

A leitura foi considerada pela professora Beatriz Vargas tão importante quanto o lançamento do livro. “O manifesto resume a importância do que é ser presidenta, pertencer a esse gênero e ser ao mesmo tempo vítima de preconceitos, de ódios, de sexismos e machismos nessa condição. Isso tinha que ser falado, porque nossa presidenta representa isso, a força da mulher. Essa fala é a cara da presidenta Dilma”, avalia Beatriz Vargas.

Carina Vitral também considera preocupante o conteúdo machista das movimentações políticas contra Dilma. “Acho que tem muito de machismo nesse golpe, de dizer que a mulher não pode”, afirma. “É preciso que a gente entenda isso e consiga combater, há um ódio muito grande contra a mulher que vem junto com esse golpe, não é à toa a quantidade de atrocidades que a gente vê no Brasil inteiro.”

O trecho final do manifesto conecta o golpe à mobilização das mulheres da UnB, ao dizer: “Abominamos os adesivos de tanques de automóveis elaborados para criticar a presidenta Dilma pelo aumento da gasolina, os quais fazem clara apologia ao estupro, um crime hediondo cometido cotidianamente contra nós. Não reconhecemos esse governo golpista que tomou o Estado brasileiro de assalto por meio de negociações escusas, como os áudios recentemente vazados revelam de modo inequívoco. A saída de Temer é o primeiro passo para o restabelecimento da democracia”.

Camilo Toscano, da Agência PT de Notícias

Tópicos:

LEIA TAMBÉM:

Mais notícias

PT Cast