Brasil pode ter 10 mil mortos em uma semana. O que falta “entender”, Teich?

Sem praticar isolamento social, Brasil já tem a maior taxa de contágio do coronavírus do mundo e pode dobrar mortes na próxima semana, aponta estudo da universidade Imperial College London, do Reino Unido. Titular da Saúde não tem plano e admite navegar “às cegas” nas águas da pandemia.

Foto: Sérgio Lima

Profissionais de saúde do SUS recebem paciente na entrada de hospital, em Brasília

A maior crise humanitária e econômico-social dos últimos 80 anos impôs às nações medidas de urgência historicamente inéditas, do completo lockdown de famílias ao fechamento das fronteiras. Diante do avanço implacável da pandemia do Coronavírus pelo mundo, o Brasil teve todas as chances de se preparar ao observar, desde o início de janeiro, o que ocorria em países como China, Itália e Espanha. Três meses e 5 mil mortos depois, o Ministério da Saúde encontra-se à deriva, sem comando, com um vacilante Nelson Teich ainda tentando “entender” a pandemia. Para auxiliar o ministro, os fatos: um estudo realizado pela universidade Imperial College London, do Reino Unido, estima que o Brasil tem hoje a maior taxa de contágio do Covid-19 do mundo. Segundo a universidade, no atual ritmo, o país pode dobrar o número de óbitos em uma semana, chegando a mais de 10 mil. Exposto o quadro catastrófico, fica a pergunta a Nelson Teich: o que falta entender?

A julgar pela participação do ministro de audiência virtual realizada na quarta-feira (29) pelo Senado, tudo. Pelo plenário virtual montado pela Casa, Teich deixou os parlamentares estupefatos pela falta de preparo, inciativa e total desconhecimento da gravidade da crise. Esquivando-se da maioria das perguntas dos senadores, o acuado ministro admitiu apenas que o Brasil está “literalmente navegando às cegas” nas águas da pandemia. “Estamos diante de um tsunami, a maior tragédia humana desde a Segunda Guerra Mundial. O Brasil, infelizmente, se aproxima das seis mil mortes devido ao vírus, a maior cifra da América Latina. E não temos um comando único”, reclamou o senador Paulo Paim (PT-RS).

Para realizar o levantamento, 47 pesquisadores estudaram a disseminação do vírus em 48 países. Após a compilação dos dados, a universidade inglesa concluiu que a taxa média de transmissão no Brasil é de R2,8. Pelos critérios da instituição, o indicador R serve para calcular para quantas pessoas cada infectado transmite a doença. Ou seja, cada pessoa doente infecta outras três. Considerando as subnotificações e o aumento expressivo do índice de mortalidade por causas respiratórias registrado nos cartórios, não é difícil concluir que a velocidade com a qual o vírus avança no país é extraordinariamente galopante.

O estudo da Imperial College coloca o Brasil lado a lado com os Estados Unidos na categoria de países com transmissão muito alta. Detalhe: atualmente, os dois são os únicos enquadrados na categoria, com previsão de óbitos acima dos 5 mil na próxima semana. Não por coincidência, os líderes das duas nações, Bolsonaro e Donald Trump, notabilizaram-se por suas investidas negacionistas contra ciência e pelo discurso sem fundamento de que o fim do isolamento irá “salvar a economia”.

Cenário de guerra

De volta à realidade, o  ex-ministro da Saúde, Arthur Chioro, desenha um cenário de guerra assustador, baseado na análise das subnotificações. “Não chegamos ainda ao pico do contágio. Estamos ainda no início, na 18ª semana de contágio e o pico será na 24ª semana, no final de maio e começo de junho”,  adverte Chioro. “Se não houver um isolamento severo, o número de óbitos pode superar 1 milhão de casos”.

Sob a insistência irresponsável e criminosa do presidente Jair Bolsonaro em relaxar a frágil quarentena no país, os brasileiros jamais praticaram isolamento social para valer.  Basta ver a reabertura de shoppings em dezenas de estados em pleno pico de contágio. Agora, milhares de famílias amargam a tragédia de enterrar seus entes queridos. “Mais quantas mortes precisam acontecer para Bolsonaro e esse ministro fazerem algo?”, questiona a deputada federal e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann.

Plano de emergência e transparência de informações

Para tentar abrir os olhos do titular do Ministério da Saúde, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) enviou uma carta a Teich, na qual pediu urgência ao ministro na apresentação de um plano de ação para o enfrentamento da pandemia. O documento foi assinado por mais de 60 entidades da comunidade científica e adverte que, “se nada for feito, os pronunciamentos do Ministério da Saúde só informarão o número de mortos”.

A carta encaminhada pela entidade enfatiza a importância do cumprimento pelo país das diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS), que estabeleceu a prática da quarentena como  principal medida no combate à epidemia. “É fundamental que a população se sinta amparada e possa ouvir uma voz uníssona que reforce essas diretrizes, assumindo uma conduta única, em consonância com o que os cientistas de todo mundo pregam”, alertam os pesquisadores. “Ainda não atingimos o pico da epidemia e o número de vítimas fatais continua em ascensão vertiginosa”, diz o texto do documento.  

Os cientistas pedem ainda transparência na divulgação de informações consideradas essenciais para o enfrentamento da doença no país, como o número de equipamentos adquiridos e pessoas testadas. “Que providências estão sendo tomadas para que haja o aumento expressivo no número de pessoas testadas para que possamos estimar o cenário epidemiológico com mais clareza e precisão?”, indaga a comunidade científica, no documento.

Os pesquisadores também levantam questionamentos sobre tratativas para a adoção da uma fila única de leitos, com a união da oferta das redes pública e privada. “Há um plano para o uso dos leitos hospitalares de modo integrado?”, pressiona a comunidade. “Diversos países fizeram a integração das redes hospitalares públicas e privadas por decisões dos governantes, com ótimos resultados na distribuição e atendimento dos doentes mais graves”, observam.

Os cientistas encerram a carta chamando a atenção para a importância do uso do conhecimento científico no esforço dos governos para salvar vidas. “Esse plano deve ser baseado em dados levantados pela ciência e espelhado em atitudes que foram executadas com sucesso por governos de outros países na contenção da infecção, poupando uma quantidade enorme de vidas”, afirmam.

Da Redação

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