Corte de bolsas poderá interromper pesquisas sobre câncer, dengue e HIV no Rio

Fiocruz e UFRJ estão entre as instituições de referência que serão prejudicadas com medida do Ministério da Educação

(Tomaz Silva/Agência Brasil)

Fachada do Hopital Universitário Clementino Fraga Filho, no Fundão, local de atendimento aos três feridos na explosão em laboratório da Coppe/UFRJ.

O corte de bolsas de pesquisa anunciado pelo governo federal em programas de pós-graduação de universidades e de instituições como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) poderá interromper pesquisas de ponta sobre câncer, dengue, zika, chikungunya, o desenvolvimento de testes para evitar a transmissão de HIV e hepatites B e C, além de diversas outras doenças.

Na última semana, o Ministério da Educação (MEC) anunciou o congelamento de quase cinco mil bolsas de pesquisa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) em todo o país. Há riscos, ainda, de mais cortes de bolsas também pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), outra importante agência de financiamento ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia.

Com o congelamento de bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado, o país corre o risco de sofrer um apagão científico. Em entrevista ao Brasil de Fato, a coordenadora de pós-graduação e pesquisa do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professora Silvana Allodi, criticou a alegação de “balbúrdia” nas universidades por setores radicais do governo e disse que as preocupações deveriam se voltar para o desenvolvimento.

“Existem problemas reais para se fazer pesquisa no Brasil. A importação de equipamentos e reagentes importantes às vezes demora cinco meses em razão de entraves burocráticos. Essa deveria ser a preocupação do governo. Mas o que estamos vendo é um corte aleatório que, graças à reação da população, pode ser parcialmente revertido”, afirmou a pesquisadora.

O Centro de Ciências da Saúde que ela coordena é composto por 31 programas de pós-graduação, dentre os quais dois do Instituto de Biofísica (que perderam 16 bolsas de doutorado), Ciências Morfológicas (que perdeu 6 bolsas de pesquisa), Farmacologia (4 bolsas), Química Biológica (3 bolsas) e Química de produtos naturais (2 bolsas).

Saúde coletiva

Além das pesquisas voltadas para o tratamento imediato de doenças graves e crônicas, o CCS/UFRJ possui também programas como o de Saúde Coletiva, cuja pós-graduação é coordenada pelo professor Armando Meyer. Ele explica que algumas das investigações que são financiadas por bolsas da Capes são pensadas para o bem-estar e saúde da população no longo prazo.

“Temos um estudo com 75 mil adolescentes de todo o país para identificar antecipadamente os riscos de doenças cardiovasculares. Essa pesquisa é inovadora porque essa abordagem só é realizada com adultos. Também pesquisamos a repercussão da poluição ambiental na saúde com o acompanhamento de todos os nascimentos na maternidade-escola da UFRJ, entrevistando e fazendo exames com mães que foram expostas a substâncias tóxicas na gestação”, enumerou o professor.

“Uma vez que se identificam os fatores de risco para determinadas doenças, podemos atuar na prevenção daquela doença e minimizar estes fatores. Isso está relacionado ao impacto e aos gastos que a saúde pública deixará de ter no futuro”, lembra Meyer, lamentando que o programa de Saúde Coletiva perdeu sua única bolsa de pesquisa de pós-doutorado.

Dengue, zika e chikungunya

A importância das pesquisas científicas pode ser avaliada no curto prazo. No momento em que o Rio de Janeiro passa por um surto de dengue, zika e chikungunya, com mais de 15 mil casos suspeitos, a Fiocruz esta semana lançou uma nova tecnologia de testagem rápida para as três doenças que foi desenvolvida durante um ano e meio. O teste exibe o resultado em 15 minutos e identifica se a infecção está no início ou se já se instalou há mais tempo.

A Fiocruz poderá produzir 10 milhões de testes por ano. A Fundação investe em pesquisas de vacinas e na produção de medicamentos para diversas doenças em institutos como o Bio-Manguinhos e o Farmanguinhos. Procurada pelo Brasil de Fato, a Fiocruz informou que ainda não tem um levantamento preciso das áreas afetadas com os cortes de bolsas de pesquisa e que precisa aguardar mais um tempo para ter essas informações.

Para esta quarta-feira (15) está programada uma greve geral, com atos em diversas cidades brasileiras, contra os cortes e o desmonte da educação e da ciência públicas.

Por Brasil de Fato

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