Municípios de Sergipe podem falir com Reforma da Previdência

Em 72% dos municípios sergipanos, os benefícios previdenciários são maiores que o Fundo de Participação dos Municípios

Maurício Pokemon/ASA

A renda das aposentadorias é indispensável para o mercado de consumo dos municípios sergipanos

Aproveitando o clima de carnaval, o governo Michel Temer pretende votar a Reforma da Previdência no dia 19 de fevereiro. Mesmo sem a certeza dos 308 votos necessários para a aprovação, o governo e seus articuladores têm apostado alto para chegar ao mínimo necessário. A última cartada foi uma chantagem contra os governadores.

Temer ameaçou liberar verbas somente para os estados onde os governadores consigam votos favoráveis à Reforma da Previdência.

Segundo o economista Luís Moura, do DIEESE/SE, a aprovação dessa reforma, ao prejudicar os trabalhadores em sua futura aposentadoria, vai atingir em cheio a economia dos municípios. Para ele, os prefeitos deveriam se atentar para isso. “Não é uma coisa pouco significativa”, avalia.

Em 54 dos 75 municípios sergipanos, o volume de pagamento de benefícios previdenciários efetuados pelo INSS supera o Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Ou seja, cerca de dois em cada três municípios sergipanos dependem mais da Previdência Social que do FPM.

Além disso, em 74,7% dos municípios sergipanos os benefícios ultrapassam a arrecadação previdenciária. “Isso mostra que a renda dos municípios é extremamente dependente dessas aposentadorias”, ressaltou o economista Luís Moura.

Em Lagarto/SE, por exemplo, os benefícios superam mais de três vezes o que é arrecadado. Dados do Dataprev mostram que o município arrecadou R$ 40.958.192 no ano de 2016, enquanto foram pagos R$ 229.185.158 em benefícios. Desse total, R$ 129.928.425 foram para a população que vive na zona rural. Já o valor do FPM para Lagarto nesse período foi de R$ 35.600.778.

Previdência Rural

Luís Moura lembra ainda que, das 900 mil pessoas ocupadas em algum tipo de atividade formal e informal em Sergipe, 400 mil estão na agricultura familiar. No entanto, elas não têm uma contribuição direta para a Previdência.

“Na maioria dos casos, os trabalhadores rurais se aposentam por idade e esse salário mínimo que recebem de aposentadoria gera um mercado de consumo extremamente importante para os municípios. O comércio local depende muito dessas aposentadorias”, ressaltou o economista.

Mesmo com as recentes mudanças na proposta de Temer, os trabalhadores rurais continuam sendo bastante afetados. A advogada e militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Bruna Vieira Barbosa, explica que a reforma cria a obrigatoriedade da contribuição mensal individual por cada membro da família durante quinze anos.

“Da forma como está, os camponeses não terão condições de arcar com as contribuições mensais de cada membro da família.” A medida atingiria também os pescadores artesanais, quilombolas e indígenas, que são enquadrados como segurados especiais.

Para Bruna, essa obrigatoriedade de contribuição mensal é uma verdadeira negação do direito à aposentadoria para os camponeses.

“Hoje no sertão de Sergipe, depois de seis anos de seca, as famílias conseguiram plantar alguma coisa de feijão e milho. Mas imagine a obrigatoriedade de pagar mensalmente, sendo que as produções no campo são sazonais, não são mensais”, completa.

Desesperança

Aos 53 anos, Maria Aparecida da Silva, camponesa do município de Porto da Folha, teria apenas mais dois anos de trabalho pela frente para se aposentar pelas regras atuais.

Desde os sete anos trabalhando na roça, hoje dividindo a vida entre a agricultura e atividades domésticas, ela teria que comprovar o período de contribuição se a Reforma da Previdência for aprovada.

“A coisa está feia para o lado dos agricultores, dos mais pobres no geral. Se trabalhar até os 55 anos, na vida que a gente leva, já era puxado, mais difícil vai ser agora, porque vamos ter que contribuir todo mês com o INSS. E como a gente vai buscar isso para pagar, se a gente vive do que planta? Tendo essa reforma – tenho fé em Deus que não vai ser aprovada – do jeito que está a gente perde a esperança. É pra gente morrer e não se aposentar”, lamenta Maria Aparecida.

Mobilização

A luta dos trabalhadores em vários locais do país foi responsável por barrar a votação da Reforma da Previdência, que seria apreciada antes do recesso parlamentar. Dentre elas, os atos e as greves gerais organizados pela Frente Brasil Popular, além da greve de fome iniciada pelo MPA na Câmara dos Deputados e que se espalhou no Brasil.

Em Sergipe, os militantes Samuel Carlos, Elielma Barros, José Valter Vitor e Eliana Sales ficaram por quatro dias em greve de fome na Assembleia Legislativa, até que a votação da reforma foi retirada de pauta.

Para o deputado João Daniel (PT-SE), foi uma vitória popular a não votação dessa reforma ainda no final do ano passado, que mostrou que só a mobilização tem condições de barrar esse retrocesso.

“Só essa pressão vinda das ruas, com a população cobrando um posicionamento de seus parlamentares, será capaz de impedir de vez a aprovação dessa proposta”, afirmou o parlamentar, que repudiou a postura do governo federal em chantagear os estados, através dos governadores, para que reverta votos contrários de sua bancada.

Os movimentos sindical e social já estão se articulando para mais uma greve, como informou o Professor Dudu, presidente da CUT/SE e membro da Frente Brasil Popular. “Eu acredito muito no poder de pressão das greves gerais, e por isso, no dia 19 de fevereiro, faremos mais uma com muita força para que a reforma da previdência não seja votada”.

De acordo com Dudu, “precisamos ampliar a pressão contra os deputados que estão inclinados em votar a favor da Reforma da Previdência. O momento conspira ao nosso lado por conta da aproximação das eleições. Quanto mais pressão popular, mais chances teremos de barrar a reforma definitivamente”.

Do Brasil de Fato

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