Reformas de Temer e Bolsonaro são tiro no pé, diz Esther Dweck

Ex-secretária de orçamento federal, economista explica por que austeridade como alternativa para crises não deu certo em nenhum lugar do mundo

Elineudo Meira

Greve Geral de 14 de junho contra a reforma da Previdência e outros desmontes do governo de Jair Bolsonaro (PSL)

Em momentos de crise econômica, apostar em uma política fiscal de austeridade é fazer o caminho oposto ao de crescimento produtivo, pleno emprego e distribuição de renda. A análise é da economista Esther Dweck, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), Dweck foi chefe da assessoria econômica e secretária de orçamento federal no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, atual Ministério da Economia.

Com o pretexto de tirar a economia do buraco, a política de corte de investimentos públicos intensifica as desigualdades sociais e, na prática, não deu certo em nenhum lugar do mundo, ressalta a professora. O projeto fiscal excludente beneficia a elite brasileira enquanto piora a qualidade de vida da população de baixa renda, explicita Dweck.

Em entrevista ao Brasil de Fato, a economista analisa o que chama de “corrida para o fundo” com as reformas da Previdência e trabalhista e a Emenda Constitucional 95, que condiciona, por 20 anos, os investimentos públicos ao reajuste da inflação. Ela afirma que a Previdência pública tem papel central na estabilização da economia do país.

“A consequência final para o Brasil é uma piora no quadro econômico, social e até o fiscal, porque se gera um círculo vicioso de perda de emprego, de renda e de arrecadação”.

Para ela, é mais do que urgente discutir uma reforma tributária e um projeto de desenvolvimento inclusivo, já que os pobres pagam mais impostos no Brasil e são os penalizados com cortes na área social, como Saúde, Educação, Segurança Pública e Justiça.

Como forma de inverter a lógica de desenvolvimento e fazer o país voltar a crescer, Dweck apresenta alternativas no livro “Economia para poucos – Impactos sociais da austeridade e alternativas para o Brasil”, organizado junto com os economistas Pedro Rossi e Ana Luíza Matos de Oliveira.

“Estão tentando reduzir a capacidade da população de acessar direitos que ela tem garantido pela Constituição, e como consequência disso, então, há uma piora muito grande na qualidade de vida das pessoas”.

Confira parte da entrevista

Brasil de Fato: Por que a austeridade, que pode aumentar a desigualdade social, é encarada como uma saída econômica?

Esther Dweck: Hoje em dia, no mundo, está se discutindo o papel da política fiscal. E é uma discussão parecida com a que se teve na década de 1940. Depois, a crise teve uma resolução, mas, o mundo, acabou passando por uma guerra mundial.

Justamente, a partir dali começou a se discutir que a política fiscal deveria ter um papel para resolver dois problemas. O primeiro, que a economia não garantia o emprego, não existia uma tendência a garantir o que a gente chama de pleno emprego. O segundo ponto era justamente a distribuição de renda.

A conclusão do debate daquele período foi que o sistema capitalista tende a gerar desigualdade e desemprego. Então, caberia ao governo contornar isso. O instrumento principal para isso seria a própria política fiscal.

Esse foi o entendimento da década de 1950, digamos assim, que durou até o final da década de 1970. E, infelizmente, entrou uma política que a gente chama de neoliberal, que quis desmontar toda essa lógica que foi pensada depois da crise de 1929 e da Segunda Guerra Mundial.

No fundo, o que a gente está vivendo hoje é esse mesmo debate.

O governo tem, na política fiscal, dois instrumentos importantes. A arrecadação e os gastos. Nos gastos do governo, você tem basicamente três grandes caixinhas. Uma caixinha que é a provisão de serviços públicos, então a provisão de saúde, educação, justiça, segurança, cultura. E, obviamente, para isso, ele contrata gente para fazer isso, ele contrata professores, médicos, juízes, advogados, uma série de pessoas que são os funcionários públicos.

A provisão do bem público ou do serviço público para a sociedade depende de gente. Então, esse é um dos grandes gastos que o governo faz que, na maioria das vezes, é gratuito o acesso, seja educação, saúde, justiça.

Por outro lado, você tem as transferências que o governo faz. As transferências são, por exemplo, a Previdência, o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada [BPC], para os idosos com condições de baixa renda ou com deficiência física, o abono salarial, o Seguro Desemprego. Tem uma outra transferência que é o pagamento de juros. Também é uma transferência do governo para as famílias brasileiras, mas que vai para um grupo muito pequenininho de famílias.

O terceiro grande grupo seria os investimentos públicos. O governo constrói pontes, estradas, universidades, institutos federais. Para isso, ele contrata empresas. Então, obviamente, se o governo consegue contratar empresas, transferir renda para as famílias – que consomem, não via juros, mas via Previdência, via Bolsa Família –, que são famílias que vão pegar aquele dinheiro e gastar na economia. Então, ele consegue ativar a economia dessa forma.

Então, esse é o lado do governo para manter o crescimento econômico forte.

Tem um outro lado. Nesse processo de arrecadar e de gastar, o governo pode fazer isso de forma a melhorar a distribuição de renda.

Se ele tributar, o que a gente chama de uma tributação progressiva, que é cobrar mais de quem ganha mais, ele reduz a desigualdade de renda. E, se quando ele devolver, ele também devolver mais para quem tem menos, ele reduz bastante a desigualdade de renda.

Confira a íntegra da entrevista.

 

Por Brasil de Fato

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